Aproxima-se a data da realização das eleições para o Reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD). Constituído o Conselho Geral, está em preparação a nova equipa reitoral. O atual Reitor, António Fontainhas Fernandes, o único candidato que se apresentou até agora, assume os seus compromissos com a UTAD. Pronuncia-se abertamente e sem rodeios sobre as questões que se levantaram acerca dos protocolos com empresas do Brasil e em relação a outros casos, tais como o de Professores que, alegadamente, cobram pela orientação das teses de mestrado e doutoramento, afirma que “sempre que é denunciada alguma situação passível de incumprimento, todas as responsabilidades são apuradas.”
PROFESSOR FONTAINHAS FERNANDES (PFF) – No período de preparação das eleições para o Conselho Geral dinamizei um fórum de discussão envolvendo cerca de cem docentes e investigadores sobre os principais desafios da Universidade, para os quais importa concertar os nossos esforços. O programa de candidatura que irei apresentar resulta desta reflexão e da participação de todos os que querem pensar a UTAD e dar corpo a um projeto coletivo, fundamental para a sustentabilidade da instituição e da região.
NVR – Pode adiantar alguns nomes que vão integrar o Conselho Geral?
PFF – Está constituído o Conselho Geral transitório que integra os representantes dos docentes e investigadores, estudantes e trabalhadores não docentes, devendo em breve ter lugar a tomada de posse dos elementos externos, personalidades de reconhecido mérito nacional e internacional, cujos nomes já foram anunciados à academia. Quatro membros transitam do anterior Conselho Geral: Dr Silva Peneda, Prof Pedro Lourtie, Prof Bianchi de Aguiar e Eng.º Luis Rochartre, a que se juntam a Prof Maria da Graça Carvalho, Prof Miguel Poiares Maduro e Dr Margarida Pinto Correia.
NVR – E sobre a sua nova equipa reitoral, pode também adiantar os nomes que a poderão vir a constituir?
PFF – Nesta fase, estou a dinamizar a preparação do programa de candidatura a Reitor, um projeto que continua a acolher ideias e apoios de todos os que querem pensar a UTAD e que prevê, igualmente, um novo formato de funcionamento. Numa fase posterior, serão divulgados os elementos que estão disponíveis para dar corpo a este projeto coletivo: equipa reitoral e presidentes de escola.
NVR – Qual o programa para o novo mandato à frente da UTAD?
PFF – O primeiro mandato foi marcado por profundas reformas estruturais que permitiram garantir o equilíbrio financeiro, aumentar a visibilidade e notoriedade da Universidade e fortalecer a ligação ao território, assentes numa estratégia que consolidou a sua identidade e deu resposta aos desafios e complexidade do momento. O futuro passa por uma aposta na participação em sólidas redes nacionais e internacionais de ensino e de investigação que possibilitem um incremento do número de alunos e da produção científica, na valorização dos recursos humanos e na atração de novos talentos e de financiamento, necessários à concretização da sua missão no ensino, na investigação e na interação com a sociedade.
NVR – Com as alterações aos estatutos da UTAD a sua gestão está mais facilitada? Em que consistiram essas alterações?
PFF – Os novos estatutos pretendem dar resposta aos conhecidos desafios atuais e prospetivos, imprimindo maior flexibilidade à estrutura organizativa, quer em termos de governação, quer de funcionamento. Os presidentes de Escola serão nomeados permitindo uma maior articulação entre a ação da equipa reitoral e as estruturas intermédias, enquanto a eleição dos presidentes dos conselhos pedagógicos e científicos vai reforçar a autonomia pedagógica e científica das Escolas.
NVR – Como está a UTAD de saúde financeira?
PFF – Durante o atual mandato a Universidade tem apresentado equilíbrio financeiro, graças a um conjunto de reformas e de medidas estruturantes que permitiram diminuir a despesa, enquanto a receita aumentou em relação ao período anterior. Em termos globais, regista-se uma crescente diminuição do peso do orçamento de estado no orçamento global da Universidade.
NVR – Como espera atrair mais alunos para a UTAD?
PFF – O aumento de estudantes exige uma clara aposta no redimensionamento e consolidação da oferta educativa, na diversificação de novos públicos privilegiando ofertas conferentes de grau em consórcio para captação de estudantes de pós-graduação nacionais e internacionais, bem como em ofertas não conferentes de grau envolvendo formatos inovadores de aprendizagem ao longo da vida. Nesta estratégia, é crucial manter uma forte determinação na promoção da qualidade de ensino e da aprendizagem, numa ótica de cultura de participação e responsabilidade.
NVR – E quanto à ligação física e social entre a UTAD e a cidade, o que tem a dizer sobre esses aspetos?
PFF – Em termos de ligação física, o plano estratégico de desenvolvimento urbano do município de Vila Real prevê a construção de uma ciclovia que irá ligar a cidade ao campus, promovendo a mobilidade urbana sustentável ancorada numa estratégia de baixo teor de carbono. Esta ligação irá permitir a qualificação do espaço público, a melhoria da gestão do estacionamento e da priorização do transporte público, no âmbito de uma política de inclusão que dê resposta aos desafios da população que se pretende mais ativa e mais saudável.
NVR – Recentemente, o nome da UTAD andou na comunicação social, não pelas melhores razões. A que ano remontam os protocolos e quando surgiram os primeiros problemas?
PFF – As peças jornalísticas emitidas pela RTP abordaram assuntos relativos aos acordos de cooperação designados de “convénios luso-brasileiros” com empresas sediadas no Brasil, que funcionaram entre 2005 e 2013, um período em que não exercia funções de Reitor.
NVR – Houve outras Universidades que tenham celebrado protocolos do mesmo género dos celebrados pela UTAD?
PFF – O aumento da procura de formações qualificadas nas economias emergentes incluindo os países de língua oficial portuguesa permitiu o alargamento do campo de recrutamento de estudantes, mas as estratégias das Universidades de atração de estudantes são diversificadas.
NVR – No fundo, qual foi o “pecado original” destes protocolos?
PFF – O principal problema dos protocolos residiu no facto de não preverem situações de incumprimento e consequentes sanções a aplicar, o que, nas atuais circunstâncias, permitiria à UTAD uma imputação clara das responsabilidades às plataformas. Saliente-se que, das plataformas vinculadas no âmbito dos convénios uma empresa manteve uma posição de conflito, por manifesta falta de saúde financeira, tentando desresponsabilizar-se do cumprimento das suas obrigações, procurando imputar à Universidade uma pretensa responsabilidade que sabe não existir. Esta empresa intentou uma ação judicial contra a Universidade que foi julgada improcedente. Não deixa de ser importante referir, aliás, que algumas plataformas foram condenadas em ações judiciais que correram termos por tribunais brasileiros, intentadas por estudantes a elas afetas, tendo como fundamento o incumprimento dos respetivos contratos celebrados.
NVR – Que medidas tomou logo que teve conhecimento da existência destes problemas?
PFF – No início do meu mandato, em julho de 2013, perante os atrasos no pagamento dos compromissos financeiros das mencionadas empresas, encetei um conjunto de medidas, designadamente: a contratação dos serviços de uma empresa de auditoria externa para efetuar um levantamento exaustivo da situação e propor medidas para regularização das dívidas, o cancelamento do funcionamento dos cursos nos moldes anteriores e a instauração de um processo de inquérito na sequência de uma queixa anónima, que, como constava na referida denúncia, foi participada ao Ministério Público.
NVR – E em relação aos alunos prejudicados, o que lhes propôs a UTAD?
PFF – A UTAD sempre manifestou uma profunda preocupação pela situação dos estudantes, tendo merecido a melhor e possível consideração. Face ao incumprimento do pagamento de propinas, a UTAD permitiu a desvinculação dos estudantes das plataformas que, por força dos contratos que outorgavam, representavam os alunos nalguns atos junto dos competentes serviços da Universidade. Por outro lado e atendendo às exposições subscritas por alunos alegando que não tinham condições financeiras para proceder ao pagamento do valor em dívida, a UTAD subscreveu acordos de confissão e de regularização da dívida que, no essencial, se traduziram na resolução do diferendo mediante o pagamento com referência ao valor fixado aos alunos nacionais.
NVR – O NVR tem conhecimento de haver professores a pedir dinheiro aos alunos de mestrado e doutoramento, quer portugueses quer brasileiros, pela orientação e apoio nas respetivas teses. Tem conhecimento disto? É legal tal pedido de pagamento?
PFF – Não tenho conhecimento de qualquer caso. No contexto de responsabilidade disciplinar da Universidade e das normas éticas e de conduta que lhe estão subjacentes, sempre que é denunciada alguma situação passível de incumprimento, todas as responsabilidades são apuradas.
NVR – Dadas as responsabilidades da UTAD no desenvolvimento da região, o que pode fazer a Universidade nesse sentido e o que, como responsável máximo pela instituição, entende que faz falta na cidade de Vila Real e na região para que esta se torne sustentável e equilibrada, e não continue a ficar sob a ameaça de desertificação?
PFF – As políticas públicas suportadas pelos fundos europeus tornaram o interior menos estigmatizado, mas as disparidades de desenvolvimento mantiveram-se, tendo a modernização da sociedade portuguesa e a sua exposição a formas mais intensas de concorrência internacional gerado novos fatores indutores de assimetrias. As aglomerações do litoral contrastam com a ausência de massa crítica do interior, um fator inibidor do dinamismo económico e do acesso a serviços avançados, o que exige uma orientação concertada das instituições do interior. É neste contexto que a cooperação da UTAD com as outras instituições deve ser perspetivada, enquanto alavanca do desenvolvimento e motor de um novo impulso do sistema regional de inovação do Norte, numa lógica de rede do conhecimento.